Li um artigo interessante essa semana, onde um psicólogo afirma que está havendo uma obsessão coletiva pelo pessimismo, que o mundo conectado está se tornando um lugar cada vez melhor e que essa obsessão é algo deslocado da realidade.
“Eu me permito ser um pouco alegre, porque me disseram que é bom para a saúde” Voltaire, filósofo iluminista frencês. Porém, eu substituiria a palavra pessimismo por otimismo, porque observo grande parcela da população e sem exceção, todas as mídias, cobrarem e exibirem um mundo de otimismo implacável, sem verificação da realidade e até mesmo negando a existência de problemas sociais crônicos, onde estão navegando coaches, líderes espirituais e mentores, hipoteticamente habilitados, induzindo as pessoas a acreditarem que viverão o paraíso na terra e num passe de mágica terão a vida transformada em uma sucessão de vitórias fáceis. O otimismo obsessivo diante da promessa de prosperar da noite para o dia, pode cegar para as duras realidades da vida, negligenciar riscos ou até mesmo negar a existência das nossas limitações.
Não fico listando as causas do fim do mundo, falo das coisas como elas são, falo das ameaças reais, da violência crônica que persegue as mulheres todos os dias e em todos os lugares, da dificuldade de se ocupar igualmente homens e mulheres os mesmos espaços públicos, do descaso diante de problemas sociais, velhos conhecidos de todos os políticos que poderiam inverter as estatísticas, falo da cara da miséria, da pobreza de oscila entre pobreza extrema e pobreza, que para a grande maioria da população esse é o limite da ascensão social. Narro sem ânimo as cenas de racismo e preconceito, porque eles se repetem à miudamente.
O pessimismo não é irrealista. Em sua essência, o pessimismo é a expectativa de que os piores resultados são mais prováveis do que os melhores. Muitos sociólogos argumentam que os humanos têm uma predisposição evolutiva para se concentrar em perigos e ameaças, pois essa sensibilidade foi historicamente vital para a nossa sobrevivência.
No mundo digitalmente conectado, as mídias se encarregam de pesar a mão, e as formas como o pessimismo se manifesta é amplificada por algoritmos que priorizam más notícias, reforçando a percepção de que tudo está desmoronando e o otimismo exagerado pode desviar o foco das perspectivas reais de derrota, pode levar a ignorar riscos e envolver-se numa teia de ilusões. A verdade é que o mundo é cheio de desafios e perigos perpétuos, os problemas são tão vastos e complexos e não há um engajamento coletivo para resolvê-los, a perpetuação da desigualdade social, da violência, da reação significativa da natureza à sua destruição, tem consequências profundas na vida do otimista e do pessimista.
Sejamos a razão. Tomando os últimos dias como exemplo, a narrativa é tensa e carregada, mas vamos relembrar o mínimo: O rateio aleatório de dinheiro público para servidores no Natal, época em que a maioria dos brasileiros não tem dinheiro para o pão e presente para os filhos; criança sendo vítima de abuso de homem predador em local público, mulher amarrada, jogada ao Rio para morrer em agonia. Longe daqui, mas no mesmo planeta que habitamos, o fogo impiedoso arde e destrói uma cidade inteira. O que tem de novo nestas manchetes? Pessimismo? Não. As cenas são brutalmente reais, ainda assim, o sonho e a esperança operam diante de casos que cortam como uma navalha.